ARTIGO
REFLEXÕES SOBRE A ERA WEB 2.0
Vera Lúcia Santin Poletto
NTE/Natal-RN
Não podemos nos esquecer que o objetivo fundamental da aprendizagem é o desenvolvimento do aluno. Na vida, são nossas estruturas mentais, ou nossa capacidade de assimilação que determinam a qualidade das trocas que realizaremos com o meio. Estas estruturas se aperfeiçoam progressivamente, de forma ordenada. A escola deve proporcionar e favorecer o desenvolvimento destas estruturas (COLL,1987). Para tanto, devemos procurar o melhor aproveitamento possível dos conteúdos, das tarefas, das interações, dos recursos e das multimídias, a fim de alcançar este objetivo.
Podemos começar este artigo com o vídeo “O que querem os estudantes hoje?” A idéia surgiu na Disciplina de Introdução a Antropologia Cultural , da Universidade de Kansas, EUA, 2007. Foi criado um vídeo pelo professor assistente Michael Wesch e 200 estudantes. Começou como um exercício para que eles dissessem e pensassem como eles aprendem e o que precisam aprender para o futuro. Esta idéia de deixar florescer o imaginário dos alunos, baseado nas suas expectativas para o futuro, logicamente estará pautada no uso constante de instrumentos tecnológicos pelos mesmos. Então a idéia de futuro estará intrinsecamente ligada a tecnologia. Como a escola dará conta desta demanda se nem todos ou apenas uma parte dos atores deste cenário estão imersos no processo tecnológico?
Temos hoje um novo perfil dos estudantes de nossas escolas, mesmo os estudantes das escolas públicas e mesmo para os alunos das séries iniciais, quanto mais os alunos maiores, das séries finais, que acessam livremente as lan house da vizinhança da escola. Com certeza não é o perfil onde pousam os objetivos cognitivos e os atitudinais dos professores que preparam as aulas destes alunos, nas diferentes escolas. Na realidade temos clareza do perfil deste estudante nascidos nesta nova era em que usar equipamentos tecnológicos é fácil e natural, mas não conseguimos mais prever o perfil do professor que foi arrastado pelo processo tecnológico e não consegue se enxergar como um usuário das mídias de informação e comunicação em seu trabalho profissional de docente. O máximo é um usuário passivo no processo..
A metodologia de ensino utilizada nas escolas, em sua grande maioria, ainda são as mesmas de dezenas de anos atrás. Podemos acrescentar o data show, que muitas vezes reproduz apenas o que se escreve na lousa, repleto de textos que se repetem semestres após semestres. Ao passo que os jovens se diferenciam neste contexto monótono e chato e vivenciam experiências priorizando o imediato, a resposta instantânea realizando diversas atividades ao mesmo tempo como afirma MARINHO:
“que hoje escuta música em seu iPod enquanto conversa pelo MSN e assiste vídeos no Youtube, que tem o computador repleto de episódios de suas séries preferidas e não consegue se imaginar em um mundo sem internet e todas essas modernidades, quando está na sala de aula precisa se submeter a sessões intermináveis onde o professor exige silêncio absoluto, tem pavor de tecnologia e, o que é ainda pior, precisa aprender conteúdos que serão completamente inúteis ao longo de sua vida”.
Como exigir que um estudante permaneça 4 horas sentado, ouvindo monólogos de “sabedoria” do professor, dentro da sala de aula, se fora dela, em diferentes ambientes virtuais, ele escreve textos, integra ao mesmo tempo vídeos, imagens e sons. Disponibiliza e compartilha informações pessoais e as de seus interesse, criando comunidades de interesses comuns, que serão seguidas e complementadas com mais informações criando novos conteúdos, que serão disponibilizados a todos. Ninguém mais quer ser um mero telespectador.
Não podemos mais dizer que nossos alunos não leem e não escrevem. Nosso julgamento é centrado nos padrões a que estamos acostumados. Ler livros clássicos ou os recomendados pelos professores. Os jovens não redigem redações semanais, mas escrevem uma quantidade considerável de e-mails, conversas pelo MSN, postam mensagens em sites de relacionamento, criam e comentam blogs. Não lêem as poesias de Fernando Pessoa se não sentirem razão para isto, mas já leram centenas de outros conteúdos (de seu interesse) como as letras de Hip Hop, os recados deixados no Orkut e Facebook, manuais do celulares e maquina fotografica, sites de futebol e de famosos, e outras informações que acham necessárias para se sentirem incluídos em seus grupos sociais. O mais importante é que o letramento não se dá apenas pelo leitura ortográfico, mas pela leitura de imagens, vídeos, áudio, etc.
O vídeo WEB 2.0 nos surpreende quando mostra a velocidade com que as informações circulam no mundo virtual e como isto vai mudando o mundo real, transformando a sociedade. Não estamos preparando para as profissões futuras e as profissões atuais não foram ensinadas no passado. O acesso as comunidades virtuais se expande de forma exponencial extrapolando fronteiras, culturas, língua e situações sócio-econômicas. Os processos de pensar coletivamente, socialização da informações e acesso globalizado ultrapassa qualquer conhecimento adquirido na escola.
Para os que nasceram imersos em tecnologia, conseguem realizar multi-tarefas, criam novos padrões de escrita e leitura não linear, modismos sem perder a personalidade, comunidades de aprendizagem online, redes sociais de interação e o melhor de não ter medo de se expressar. É um novo mundo, não mais segmentado por grupos de opinião, mas por múltiplas linguagens, onde todos são aceitos. Abro um parênteses para dizer que nem tudo é maravilhoso na Internet, pois assim como tem informações que socializadas contribuem para o bem comum, tem também discriminação, fobias, crimes e perigos no mundo virtual. O excesso de informação sem controle de qualidade, o anonimato do autor, e a busca do minuto de fama é tão prejudicial quanto a exclusão digital.
O vídeo A máquina somos nós apresenta o fascinante mundo do hipertexto que nos proporciona diferentes condições de autor e/ou leitor e também de professor e/ou aluno. A leitura não linear nos torna autônomos no acesso as informações. Buscamos e aprendemos o que nos interessa e aquilo que nos é necessário para complementar o que já sabemos. Isto nos torna únicos na seqüência de nossa leitura. Para quem quer se aventurar no mundo WEB , o ambiente da internet exige a aprendizagem de uma nova linguagem para poder ser disponibilizada e lida pelos browsers. A linguagem HTML permite sermos produtores de conteúdos e criadores de páginas que poderão ser acessadas por todos os usuários. Hoje vários sites disponibilizam espaços para publicação sem que seja necessário conhecimentos mais profundos destes ambientes. Os blogs são muito simples de serem construídos e publicados.
Tecnologias sempre causam impactos é um vídeo que mostra os conflitos existenciais quando quebram-se paradigmas. O conflito de aprendizagem para quem migra para uma nova era, para os que fazem parte da transição de uma cultura sócio-cultural para outra. A analogia com a inclusão digital é divertida, mas infelizmente revela uma verdade presente nas escolas. Hoje as escolas publicas e privadas possuem em seus patrimônios físicos, computadores, data show, maquinas fotográficas, vídeo, acervos de DVDs, mas isto não enriqueceu a aprendizagem nem melhorou os índices de avaliação de forma convincente. Podemos ver a figura do professore diante da tecnologia: inseguro, desmotivado e incapaz de lidar com o novo.
É importante encorajar desde cedo uma atitude equilibrada e crítica em relação ao computador. Ele não deve ser visto como algo assustador ou complexo demais, mas da mesma forma, a informática não pode ser encarada como a solução para os problemas do ensino. O vídeo Novas tecnologias incentiva o professor a transformar a sala de aula num ambiente lúdico, onde o aluno sinta vontade de aprender. O aluno aprende muito mais quando ele mesmo acessa, pesquisa e interage com as informações que lhe interessam, e a computação + Internet facilitam muito a implementação desse principio, portanto o professor precisa se apropriar das tecnologias disponíveis na escola. Ou ele encara este desafio ou perdera o controle da sala de aula. Não poderá enganar os alunos como sendo o centro do saber por muito tempo.
O Buraco no Muro é um dos vídeos mais interessantes que assisti sobre apropriação tecnológica pelas crianças. Assim como o Professor geronimo falou em sua entrevista o computador traz desafios lúdicos que faz que que as crianças se envolvam na resolução sem perceber que estão estudando. O processo ensino aprendizagem flui dos dois sentidos. Ora a criança aprende ora ela ensina. Aprendem e ensinam colaborativamente. Não podemos mais colocar o aluno como um elemento passivo na aprendizagem.
Outra compreensão que devemos ter é não correr o risco de usar a tecnologia como o fim da aprendizagem. Os meios tecnológicos devem ser agregados no processo de transformação das informações em conhecimentos como instrumentos pedagógicos, os facilitadores da aprendizagem. As crianças do vídeo eram de um bairro pobre na India, mas isto não foi barreira ou impedimento para aprenderem a usar o computador, acessar a Internet e obter informações. Segundo Tornaghi (2010) em seu texto O que é cultura digital, destaca sobre o vídeo que as máquinas que permitem interação, nos desafiam a fazer descobertas e criar soluções para os desafios de aprender a usá-la ou navegar nos ambientes virtuais que proporcionam. O mesmo autor alerta para:
É importante que isto não se confunda com o ato de ensinar. O que se aprende de forma autônoma, desafiado por jogos e pelo espaço virtual, pode e deve ser ampliado e contextualizado pela ação deliberada do ensino. Nos jogos, aprende-se a caminhar pelas próprias pernas, a arriscar e inventar soluções criativas para resolver situações que o jogo, com suas regras e limites, nos impõe. Na escola, vai-se além disso. Podendo trabalhar da mesma forma, por jogos e desafios, organiza-se o conhecimento produzido pela humanidade, provocando os estudantes a construírem seu conhecimento em interação com o entorno e aprendendo a interferir no mundo real, contribuindo para fazer dele um ambiente digno para se viver, e a lutar por isto.
Como a sala de aula conseguirá acompanhar esta evolução? É uma reflexão para todas esferas educacionais, pois muitos paradigmas deverão ser quebrados ou modificados. Mas a escola sozinha não produzirá modificações adequadas sem a fundamentação das pesquisas universitárias. A tecnologia só será válida na escola se estiver a serviço dos conteúdos, “essas ferramentas devem colaborar para trabalhar conteúdos que muitas vezes nem poderiam ser ensinados sem elas” afirma Regina Scarpa (NOVA ESCOLA, set/2009).
O vídeo A música reúne o mundo que exemplifica a possibilidade de se fazer música colaborativamente, reuniu pessoas que tocam seus instrumentos em espaços diferentes, utilizando a internet como meio de aproximação e coordenação. Esta experiência pode servir para mostrar que hoje, com a Internet, perdeu-se a idéia de limites geográficos e distâncias entre países. É a desterritorialização no espaço virtual.
“... um espaço desterritorializado ,na medida em que não são mais os limites geográficos que nos separam ou unem, mas as diferenças e proximidades culturais. As culturas se misturam sem perder identidade, ao contrário da homogeneização que víamos quando uma cultura se sobrepunha às demais nos meios de comunicação tradicionais, em que poucos falavam para muitos.” (TORNAGHI, 2010).
É possível mobilizarmos pessoas que não se conhecem e não se compreendem linguísticamente, através do espaço digital. Quando as pessoas tem um objetivo comum, com o uso das redes sociais, tem um poder até a poucos dias desconhecido, como foi o caso da derrubada de uma ditatura de três décadas no Egito.
Estas reflexões expostas aqui serão de grande valia para a introdução do Projeto UCA, na Escola Municipal Herly Parente na cidade de Natal – RN.
É um grande desafio para nós educadores do NTE que faremos a capacitação dos professores, para os educadores a nível pedagógico em sala de aula como para a gestores da escola que deverá junto a SME rever os parâmetros de avaliação, grade das disciplinas e mesmo o calendário escolar.
BIBLIOGRAFIA
COLL, C. As Contribuições da psicologia para a educação: teoria genética e aprendizagem escolar. In: L.Banks-Leite. Piaget e a Escola de Genebra. São Paulo. Editora Cortez. 1987 (p. 164-197).
MARINHO, Leonardo. Uma visão dos estudantes de hoje.
TORNAGHI, Alberto. O que é cultura digital.